A Leveza do Meu Ser

Gosto do nome Tomás e, quase sem dar por isso, deixei que ele tomasse conta de mim tornando-se no meu alter-ego quando escrevo. Um nome que fui buscar a uma das minhas personagens favoritas, protagonista do célebre romance de Milan Kundera, escritor com cuja escrita vibro e me identifico.
Gosto também de ler António Lobo Antunes. Como tanta gente, fascinam-me as suas crónicas, a maneira como imagina e descreve factos ou sentimentos, a forma escorreita e original como escreve. Algumas das histórias que se seguem foram escritas indo atrás da sua maneira de brincar com as palavras, num exercício que começou como mera brincadeira e sem qualquer pretensão de se lhe comparar.
Wolf tem por isso uma ligação evidente ao escritor português; mas também pelo Lobo/animal e por tudo o que ele representa no imaginário de cada um de nós.

«O lobo é a força da alcatéia e a alcatéia é a força do lobo» (Joseph Rudyard Kipling, escritor e poeta britânico, 1865/1936, em «O Livro da Selva»)

quinta-feira, maio 10

Obsessão


Acordo com os teus dedos escorregando pelas minhas costas a caminho das nádegas e, quando me volto, pressinto pelo teu olhar desperto que há muito eles devem vaguear por lá à espera de um sinal de resposta do meu corpo

(e eu a imaginar que era um sonho...),

para logo sorrir sonolento e meigo nos teus lábios que se aproximam, escolhendo o arrepio que a tua língua provoca ao passear pelos meus.

Tens uns olhos doces e marotos que parecem amêndoas, brilhando para mim umas vezes gulosos de desejo, outras ternos de esperança e paixão, não sei o que te dizer nas alturas em que só me apetece mergulhar a boca em ti e repousar a cabeça no teu peito quando me enlaças.

Mesmo sem o poder ver, adivinho que o teu olhar vagueia em pensamentos enquanto me afagas os cabelos, mas o meu preenche-se com o bico negro e carnudo do teu seio que já rola suave entre os meus dedos.

Depois, sei que nos vamos voltar a amar até que exaustos e suados nos deixemos descair para outra dimensão ou que a fome nos empurre para a vontade de saciar outras vontades do corpo e eu, já sem tempo para ler ou escrever, até nos poucos momentos em que me deixas adormecer não descanso porque sonho contigo, com as tuas mãos, boca, cheiro e sabor, com a voz e até mesmo com as palavras que instantes antes sussurraste junto do meu ouvido e teimam em não fazer sentido!

«— Onde isto nos vai levar Tomás? Começo a sentir saudades do tempo que passa...»

Eu já não me recordo como e onde te conheci, como chegaste até mim e eu entrei em ti, se calhar até foste tu a entrar primeiro tomando conta do meu pensamento e dando o corpo às mais secretas fantasias

«— Tira uns dias Tomás, tira uns dias e prometo-te o paraíso e os trópicos sem sairmos daqui...»

e cumpri, tirei, fiquei e deixei-me envolver enquanto me invadias deleitando a tua sede e satisfazendo a minha fome de volúpia.

Há instantes em que o prazer me faz pensar que tudo não passa de um sonho, outras até em que me julgo em delírio, depois sei que o calor que sinto não é febre mas o sol que teima em massacrar a janela do quarto, torna pesado e quente o ar que o calor dos nossos corpos em movimento não deixou arrefecer durante o esfriar da noite.

« — Tomás!...»

e eu arrasto-me até à casa de banho, o chão frio da tijoleira refresca-me, e antes de te passar a toalha vejo-te para lá das cortinas de braços elevados, mãos esfregando a cabeça e pelo baço do tecido a silhueta farta dos teus seios, consigo imaginar até a espuma escorrendo ao longo da tua pele que tem o tom de canela, a água pingando indolentemente dos poucos pêlos púbicos que deixaste ficar.

Ao mirares-te no espelho amplo que reflecte a luz dos teus olhos claros, fazes o mesmo movimento de braços, desta vez escovando os cabelos ainda húmidos que rebeldes teimam em dispersar-se sobre os teus ombros, e logo tomo os teus seios nas minhas mãos abraçando-te pelas costas, sentindo esmagar-me nas tuas nádegas enquanto sorris languidamente e me entregas o pescoço para o beijar.

Ao ergueres o queixo, fechares os olhos e pelos lábios entreabertos escapar um suspiro sem ais, sei que não vou conter-me e excitado penetrar o líquido permanente que há em ti, sem perceber onde fui encontrar forças para o voltar a fazer ou até se sobreviverei à intensidade do deleite que nascendo, crescendo e soltando-se violentamente sem rédea me faz duvidar que seja terrestre.

Já dei por mim a ensaiar as palavras com as quais quero confessar-te que já não aguento, ainda que bom o caminho para a loucura, o trópico do teu sexo esvaziou-me, mais do que o corpo a mente que deixou de ser capaz de criar.

Mas sempre que regressas toco e desejo a mulher que explode de ti, mimo as iguarias com que me delicias e paradoxo-me na hesitação das frases que então faço por esquecer, ansiando que o paraíso de sensações jamais termine.

Aliás, já nem sei bem em que pensar; num instante tenho pouco tempo e vontade de permanecer neste lugar, para logo me sentir refém da mão que sabiamente me aprisiona e da boca que subtrai o pouco de mim que ainda resta...